terça-feira, 17 de maio de 2016

A IMPERATRIZ ASPECTOS DO DOGMA E RITUAL ELIPHAS LEVI E CROWLEY

A IMPERATRIZ abordada como Dogma por Eliphas Levi
O Triangulo de Salomão
PLENITUDO VOCIS – BINAH - PHYSIS
O verbo perfeito é o ternário, porque supõe um princípio inteligente, um princípio que fala e um princípio falado.
O absoluto, que se revela pela palavra, dá a esta palavra um sentido igual a si mesmo, e cria um terceiro sentido na inteligência desta palavra.
É assim que o sol se manifesta pela sua luz e prova esta manifestação ou a torna eficaz pelo seu calor.
O ternário está traçado no espaço pela ponta culminante do céu., o infinito em altura, que se une por outras linhas retas e divergentes ao oriente e ao ocidente.
Mas a esse triângulo visível, a razão compara um outro triângulo invisível, que ela afirma ser igual ao primeiro: é o que tem por cimo a profundeza e cuja base virada é paralela à linha horizontal que
vai do oriente ao ocidente.
Estes dois triângulos, reunidos numa só figura, que é a de uma estrela de seis raios, formam o signo
sagrado do selo de Salomão, a estrela brilhante do macrocosmo.

A idéia do infinito e do absoluto é expressa por este signo, que é o pantáculo, isto é, o mais simples
e o mais completo resumo da ciência de todas as coisas.A própria gramática atribui três pessoas ao verbo. A primeira é a que fala, a segunda é aquela a quem se fala, a terceira é aquela de quem se fala.
O princípio infinito, ao criar, fala de si mesmo a si mesmo.
Eis a explicação do ternário e a origem do dogma da Trindade.
O dogma mágico também é um em três e três em um.
O que está em cima assemelha-se ou é igual ao que está em baixo.
Assim, duas coisas que se assemelham e o verbo que exprime a sua semelhança, fazem três.
O ternário é o dogma universal.
Em magia, princípio, realização, adaptação; em alquimia, azoth, incorporação, transmutação; em
teologia, Deus, encarnação, redenção; na alma humana, pensamento, amor e ação; na família, pai, mãe e filho. O ternário é o fim e a expressão e suprema do amor: dois se procuram só para ficarem
três.
Há três mundos inteligíveis, que correspondem uns aos outros pela analogia hierárquica: - o mundo
natural ou físico, o mundo espiritual ou metafísico, e o mundo divino ou religioso.
Deste princípio, resulta a hierarquia dos espíritos, divididos em três ordens e subdivididos nestas
três ordens, sempre pelo ternário.
Todas estas revelações são deduções lógicas das primeiras noções matemáticas do ente e do
número.
A unidade, para tornar-se ativa, deve multiplicar-se. Um princípio indivisível, imóvel e infecundo,
seria a unidade morta e incompreensível.
Se Deus só fosse um, nunca seria criador nem pai. Se fosse dois, haveria antagonismo ou divisão no infinito, e seria a partilha ou morte de todas as coisas possíveis; é, pois, três, para criar de si mesmo
e à sua imagem a multidão infinita dos entes e números.
Assim, ele é realmente único em si mesmo e tríplice na nossa concepção, o que no-lo faz ver também tríplice em si mesmo e único na nossa inteligência e no nosso amor.
Isto é um mistério para o crente e uma necessidade lógica para o iniciado nas ciências absolutas e
reais.
O Verbo manifestado pela vida é a realização ou a encarnação.
A vida do Verbo, realizando seu movimento cíclico, é a adaptação ou a redenção. Este tríplice
dogma foi conhecido em todos os santuários esclarecidos pela tradição dos sábios. Quereis vós
saber qual é a verdadeira religião? Procurai aquela que realiza mais na ordem divina; a que
humaniza Deus e diviniza o homem; a que conserva intacto o dogma do ternário, que encarna o
Verbo, fazendo ver e tocar Deus aos mais ignorantes: enfim, aquela cuja doutrina convém a todos e
pode adaptar-se a tudo; a religião que é hierarquia e cíclica, que tem, para as crianças, alegorias e
imagens; para os homens feitos, uma alta filosofia; sublimes esperanças e doces consolações, para
os velhos.
Os primeiros sábios que procuravam a causa das causas viram o bem e o mal no mundo;
observaram a sombra e a luz; compararam o inverno à primavera, a velhice à juventude, a vida à
morte, e disseram: - A causa primeira é benfeitora e rigorosa, ela vivifica e destrói.
- Há, pois, dois princípios contrários, um bom e um mau? – gritaram os discípulos de Manés.
- Não, os dois princípios do equilíbrio universal não são contrários, se bem que, em aparência, sejam opostos: porque é uma sabedoria única que opõe um ao outro.
O bem está à direita e o mal à esquerda; mas a bondade suprema está acima dos dois, e ela faz servir
o mal ao triunfo do bem, e o bem à reparação do mal.
O princípio de harmonia está na unidade, e é o que dá, em magia, tanto poder ao número impar:
Mas o mais perfeito dos números ímpares é três, porque é a trilogia da unidade.
No trigramas de Fo-Hi, o ternário superior de compõe de três yang ou figuras masculinas, porque, na idéia de Deus, considerado como princípio de fecundidade nos três mundos, não se poderia
admitir nada de passivo.
É também por isso que a trindade cristã não admite a personificação da mãe, que é implicitamente
enunciada na do filho. É também por isso que é contrário às leis da simbologia hierática e ortodoxa
personificar o Espírito Santo sob a figura de uma mulher.
A mulher sai do homem, como a natureza sai de Deus: por isso, o Cristo se eleva a si próprio ao céu
e assume a Virgem Mãe; dizemos a ascensão do Salvador e a assunção da mãe de Deus.
Deus, considerado como Pai, tem a natureza por filha.
Como Filho, tem a Virgem por mãe e a Igreja por esposa.
Como Espírito Santo, ele regenera e fecunda a humanidade.
É assim que, nos trigramas de Fo-Hi, aos três yang superiores correspondem os três yin inferiores,
porque os trigramas de Fo-Hi são um pantáculo semelhante aos dois triângulos de Salomão, mas
como uma interpretação ternária dos seis pontos da estrela flamejante:
O dogma é tanto mais divino quanto mais verdadeiramente for humano, isto é, quanto resumir a mais alta razão da humanidade; por isso, o Mestre que chamamos o Homem-Deus se chamava a si
mesmo o Filho do homem.
A revelação é a expressão da crença admitida e formulada pela razão universal no verbo humano.
É por isso que se diz que, no Homem-Deus, a divindade é humana e a humanidade é divina.
Dizemos tudo isto filosoficamente e não teologicamente; e isto de modo algum toca no ensino da
Igreja, que condena e sempre deve condenar a magia.
Paracelso e Agrippa não elevaram altar contra altar e se submeteram à religião dominante no seu
tempo. Aos eleitos da ciência, as coisas da ciência, aos fiéis, as coisas da fé.
O imperador Juliano, no seu hino ao rei Sol, dá uma teoria do ternário, que é quase identicamente a
mesma que a do ilustre Swedenborg.
O sol do mundo divino é a luz infinita, espiritual e incriada; esta luz de verbaliza, se é permitido
falar assim, no mundo filosófico, e torna-se o foco das almas e da verdade; depois, ela se incorpora
e fica luz visível no sol do terceiro mundo, sol central dos nossos sóis, e do qual as estrelas fixas são
as faíscas sempre vivas.
Os cabalistas comparam o espírito a uma substância que fica fluida no meio divino e sob a
influência da luz essencial, mas cujo exterior se endurece como a cera exposta ao ar, nas regiões
mais frias do raciocínio ou das formas visíveis. Essas cascas ou envoltórios petrificados (diríamos
melhor, carnificados, se o termo fosse francês) são a causa do erro e do mal, que provêm do peso e
da dureza dos envoltórios anímicos. No livro de Zohar e no da revolução das almas, os espíritos
perversos, ou maus demônios, não são denominados de outro modo senão de cascas, cortices.
As cascas do mundo dos espíritos são transparentes, as do mundo material são opacas; os corpos são mais do que só cascas temporárias e de que as almas devem ser liberadas; mas os que nesta vida obedecem ao corpo, fazem para si um corpo interior ou uma casca fluídica, que fica sendo a sua
prisão e o seu suplício depois da morte, e até o momento em que chega a fundi-la no calor da luz
divina, aonde o seu peso lhe impede de subir; eles chegam aí só com esforços infinitos e o auxílio
dos justos que lhes dão a mão, e durante todo esse tempo são devorados pela atividade interior do espírito cativo, como que numa fornalha ardente. Os que chegam à fogueira da expiação aí se queimam como Hércules no monte Eta e se libertam, assim, do seu incômodo; mas a maioria tem
falta de coragem diante desta última prova, que lhe parece uma segunda morte, mais horrível do que
a primeira, e ficam assim, no inferno, que é eterno de direito e de fato, mas no qual as almas nunca
são precipitadas nem retidas contra sua vontade.
Os três mundos se correspondem mutuamente pelos trinta e dois caminhos de luz, que são os
degraus da escada santa; todo pensamento verdadeiro corresponde a uma graça divina no céu, e a
uma obra útil na terra. Toda graça de Deus suscita uma verdade e produz um ou vários atos, e
reciprocamente todo ato move nos céus uma verdade ou uma mentira, uma graça ou um castigo.
Quando um homem pronuncia o tetragrama, escrevem os cabalistas, os nove céus recebem um
abalo, e todos os espíritos gritam uns aos outros: “Quem, pois, perturba assim o reino do céu?"
Então, a terra revela ao primeiro céu os pecados do temerário que toma em vão o nome do eterno, e
o verbo acusador é transmitido de círculo em círculo, de estrela em estrela, de hierarquia em
hierarquia.
Toda palavra tem três sentidos, toda ação um tríplice valor, toda forma uma tríplice idéia, porque o
absoluto corresponde, de mundo em mundo, com suas formas. Toda determinação da vontade humana modifica a natureza, interessa a filosofia e se escreve no céu. Há, pois, duas fatalidades,
uma que resulta da vontade do incriado e de acordo com a sua sabedoria, e outra que resulta das
vontades criadas e de acordo com a necessidade das causas segundas, nas suas relações com a causa
primeira.

Nada, pois é indiferente na vida e as nossas determinações, aparentemente mais simples, provocam
muitas vezes uma série incalculável de bens ou de males, principalmente nas relações do nosso
diáfano com o grande agente mágico, como explicaremos alhures.
O ternário, sendo o princípio fundamental de toda a Cabala ou tradição sagrada de nossos
antepassados, teve de ser o dogma fundamental do cristianismo, de que explica o dualismo aparente pela intervenção de uma harmoniosa e onipotente unidade. O Cristo não escreveu o seu dogma, e só
o revelou em segredo ao seu discípulo favorito, único cabalista, e grande cabalista entre os
apóstolos. Por isso, o Apocalipse é o livro da gnose ou doutrina secreta dos primeiros cristãos,
doutrina cuja chave é indicada por um versículo secreto do Pater, que a Vulgata não traduz, e que
no rito grego (conservador das tradições de São João) só é permitido aos padres pronunciar. Este versículo, perfeitamente cabalístico, se acha no texto grego do evangelho conforme São Mateus e
em vários exemplares hebraicos. Ei-lo nestas duas línguas sagradas:
ןער וייד אּןי איר תבוּלמ ןוּא איר הבוּבג
ןוּא איר עה רטײקבילףױא גיבּײא ןמא
Διότι σου ειναι ή βασιλεία χαι ήδύναμις χαι ή δὸξα, εὶς
τοὺς αὶωνας. Άμήν.
A palavra sagrada Malkuthh, substituída por Kether, que é seu correspondente cabalístico, e a
balança de Geburah e Chesed, repetindo-se nos círculos ou céus que os gnósticos chamavam Eones,
dão, nesse versículo oculto, a chave de arco de todo o templo cristão. Os protestantes traduziram-no
e o conservaram no seu Novo Testamento, sem achar a sua alta e maravilhosa significação, que lhes
teria desvendado todos os mistérios do Apocalipse; mas é uma tradição na Igreja que a revelação
destes mistérios está reservada para últimos tempos.
Malkuthh, apoiado em Geburah e Chesed, é o templo de Salomão, tendo por colunas Jakin e Boaz.
É o dogma de adâmico, apoiado, de um lado, sobre a resignação de Abel, e, de outro, sobre o
trabalho e os remorsos de Caim; é o equilíbrio universal do ser, baseado sobre a demonstração da
alavanca universal, procurada inutilmente por Arquimedes. Um sábio que empregou todo o seu
talento para fazer-se obscuro e que morreu sem ter querido fazer-se compreender, tinha resolvido
esta suprema equação, achada por ele na Cabala, e temia antes de tudo que, exprimindo-se mais
claramente, pudessem saber a origem das suas descobertas. Ouvimos um dos seus discípulos e
admiradores indignar-se, talvez de boa fé, ouvindo chamá-lo de cabalista, e, entretanto, devemos
dizer, para a glória deste sábio, que as suas investigações abreviaram consideravelmente o nosso
trabalho sobre as ciências ocultas, e que a chave da alta Cabala, que acabamos de criar, foi
doutamente aplicada a uma reforma absoluta de todas as ciências nos livros de Hoené Wronski.
A virtude secreta dos Evangelhos está, pois, contida em três palavras e essas três palavras fundaram
três dogmas e três hierarquias. Toda ciência repousa sobre três princípios, como o silogismo sobre
três termos. Há também três classes distintas ou três classes originais e naturais entre homens, que
são todos chamados a subir da mais inferior à mais elevada. Os hebreus chamam estas séries ou
graus do progresso dos espíritos, Asiah, Jezirah e Briah. Os gnósticos, que eram os cabalistas
cristãos, chamavam-nas Hylé, Psiquê e Gnosis; o círculo supremo chamava-se, entre os hebreus,
Aziluth, e entre os gnósticos, Pleroma.
No tetragrama, o ternário, tomado no começo da palavra, exprime a copulação divina; tomado no
fim, exprime o feminino e a maternidade. Eva tem um nome de três letras, mas o Adão primitivo é
expresso pela única letra Jod, de modo que Jeová devia ser pronunciado Iéva. Isto nos leva ao
grande e supremo mistério da magia, expresso pelo quaternário.


A IMPERATRIZ abordada como Ritual por Eliphas Levi

CAPÍTULO III
O TRIÂNGULO DE PANTÁCULOS
O abade Trithemo, que foi, em magia, o mestre de Cornélio Agrippa, explica, na sua Estenografia, o segredo das conjurações e evocações de um modo muito filosófico e muito natural, mas, talvez por isso mesmo, muito simples e muito fácil.
Evocar um espírito, diz ele, é entrar no pensamento dominante desse espírito e, se nos elevarmos moralmente mais alto na mesma linha, arrastaremos esse espírito conosco e ele nos servirá; de outromodo, ele nos arrastará no seu círculo e nós o serviremos.
Conjurar é opor a um espírito isolado a resistência de uma corrente e de uma cadeia: cum jurare, jurar mutuamente, isto é, fazer ato de uma fé comum. Quanto mais esta fé tem entusiasmo e força, tanto mais a conjuração é eficaz. É por isso que o cristianismo nascente fazia calarem-se os oráculos: só ele possuía, então, a inspiração e a força. Mais tarde, quando São Pedro envelheceu, isto é, quando o mundo acreditou ter acusações legítimas a fazer ao papado, o espírito de profecia veio substituir os oráculos; e os Savanarola, Joaquim de Flora, os João Huss e tantos outros agitaram por sua vez os espíritos e traduziram em lamentos e ameaças as inquietações e revoltas secretas de todos os corações.
Podemos, pois, estar sós para evocar um espírito, mas para o conjurar é preciso falar em nome de
um círculo ou de uma associação; e é o que representa o círculo hieroglífico traçado ao redor do
mago, durante a operando, e do qual não deve sair, se não quiser perder, no mesmo instante, todo o
seu poder.
Examinemos claramente, aqui, a questão principal, a questão importante: são possíveis a evocação
real e a conjuração de um espírito, e esta possibilidade pode ser cientificamente demonstrada? À
primeira parte da questão pode-se responder, primeiramente, que todas as coisas cuja impossibilidade não é evidente podem e devem ser admitidas, provisoriamente, como possíveis. À
segunda parte, dizemos que, em virtude do grande dogma mágico da hierarquia e da analogia
universal, podemos demonstrar, cabalisticamente, a possibilidade das evocações reais; quanto à
realidade fenomenal do resultado das operações mágicas conscienciosamente realizadas, é uma
questão de experiência, e, como já dissemos, verificamos por nós mesmos esta realidade, e
poremos, por este Ritual, os nossos leitores em condições de renovar e confirmar as nossas
experiências.
Nada perece na natureza e tudo o que viveu continua a viver sempre sob formas novas; mas até as
formas anteriores não são destruídas, porque as achamos na nossa memória. Não vemos, em
imaginação, a criança que conhecemos e que agora é um velho? Até os traços que acreditamos
apagados na nossa lembrança não o estão realmente, porque uma circunstância fortuita os evoca e nô-los faz lembrar. Mas, como os vemos? Já dissemos que é na luz astral, que os transmite ao nosso
cérebro pelo mecanismo do aparelho nervoso.
De outro lado, todas as formas são proporcionais e analógicas à ideia que as determinou; são o
caráter natural, a assinatura desta ideia, como dizem os magistas, e desde que evocamos ativamente a idéia, a forma se realiza e se produz.
Schroepffer, o famoso iluminado de Leipzig, tinha lançado, pelas suas evocações, o terror em toda a
Alemanha, e a sua ousadia nas operações mágicas fora tão grande, que a sua reputação se lhe tornou
um fardo insuportável; depois deixou-se arrastar pela imensa corrente de alucinações que deixara
formar-se; as visões do outro mundo o desgostaram deste mundo, e ele suicidou-se.
Esta história deve deixar circunspetos os curiosos de magia cerimonial. Não violentamos
impunemente a natureza, e não jogamos sem perigo com forças desconhecidas e incalculáveis.
É por esta consideração que nós nos recusamos, e que nos recusaremos sempre, à vã curiosidade dos
que querem ver para crer; e responder-lhes-emos o que dizíamos a um personagem eminente da
Inglaterra, que nos ameaçava com a sua incredulidade: “Tendes perfeitamente o direito de não crer;
da nossa parte, não ficaremos, por isso, mais desanimados nem menos convencidos”.
Aos que viessem dizer-nos que realizaram, escrupulosamente e corajosamente, todos os ritos e que nada se produziu, diremos que farão bem de ficar nisso, e que é, talvez uma advertência da natureza que recusa para eles estas obras excêntricas, mas também que, se persistirem na sua curiosidade, só
tem de recomeçar.
O ternário, sendo a base do dogma mágico, deve necessariamente ser observado nas evocações; por
isso, é o número simbólico da realização e do efeito. A letra c é ordinariamente traçada nos
pantáculos cabalísticos que têm por objeto a realização de um desejo. Esta letra é também a marca do bode emissário na Cabala mística, e Saint-Martin observa que esta letra, intercalada no incomunicável tetragrama, fez dele o nome do Redentor dos homens: hw c h y.
É que os mistagogos da Idade Média representaram, quando, nas suas assembléias noturnas,
exibiam um bode simbólico, trazendo na cabeça, entre os dois chifres, um facho aceso. Este animal
monstruoso, cujas formas alegóricas e culto bizarro descreveremos no décimo quinto capítulo deste
Ritual, representava a natureza votada ao anátema, mas resgatada pelo sinal da cruz. Os ágapes gnósticos e as priapéias pagãs que se faziam em sua honra revelavam bastante as conseqüências
morais que os adeptos queriam tirar desta exibição. Tudo isso será explicado com os ritos, proibidos
e considerados, agora, como fabulosos, do grande Sabbat da magia negra.
No grande círculo das evocações, ordinariamente é traçado um triângulo, e é preciso observar bem
de que lado deve ser posto o seu cimo.. Supõe-se que o espírito vem do céu, o operador deve ficar
no cimo e colocar o altar das fumigações na base; deve-se subir do abismo, o operador ficará na
base e o fogareiro será colocado no cimo. Além disso, é preciso ter na fronte, no peito e na mão
direita o símbolo sagrado dos dois triângulos reunidos, formando a estrela de seus raios, cuja figura
reproduzimos, e que é conhecida, em magia, sob o nome de pantáculo ou selo de Salomão.
Independentemente destes signos, os antigos faziam uso, nas suas evocações, das combinações
místicas dos nomes divino que demos no dogma conforme os cabalistas hebreus. O triângulo
mágico dos teósofos pagãos é o célebre ABRACADABRA, ao qual atribuíam virtudes
extraordinárias, e que figuravam assim:
ABRACADABRA
ABRACADABR
ABRACADAB
ABRACADA
ABRACAD
ABRACA
ABRAC
ABRA
ABR
AB
A
Esta combinação de letras é uma chave do pentagrama. O A que começa é repetido cinco vezes e
reproduzido trinta vezes, o que dá os elementos e números destas duas figuras:
O A isolado representa a unidade do primeiro princípio ou do agente intelectual ou ativo. O O A
unido ao B representa a fecundação do binário pela unidade. O R é o sinal do ternário, porque
representa hieroglificamente a efusão que resulta da união dos dois princípios. O número 11 das
letras da palavra ajunta a unidade do iniciado ao denário de Pitágoras; e o número 66, total de todas
as letras adicionadas, forma cabalisticamente o número 12, que é o quadrado do ternário e, por
conseguinte, a quadratura mística do círculo. Notemos, de passagem, que o autor do Apocalipse,
esta clavícula da Cabala cristã, compôs o número da besta, isto é, a idolatria, acrescentando um 6 ao
duplo senário do Abracadabra: o que dá cabalisticamente 18, número assinado no Tarô como signo
hieroglífico da noite e dos profanos, a lua com as torres, o cão, o lobo e o caranguejo; número
misterioso e obscuro, cuja chave cabalística é o 9, o número da iniciação.
O cabalista sagrado diz expressamente a este respeito: “Que aquele que tem a inteligência (isto é, a
chave dos números cabalísticos) calcule o número da besta, porque é o número do homem, e este
número é 666”. É, com efeito, a década de Pitágoras multiplicada por si mesma e ajuntada à soma
do Pantáculo triangular de Abracadabra; é, pois, o resumo de toda a magia do mundo antigo, o
programa inteiro do gênio humano, que o gênio divino do Evangelho queria absorver ou suplantar.
Estas combinações hieroglíficas de letras e números pertencem à parte prática da Cabala, que, sob
este ponto de vista, se subdivide em gematria e temurah. Estes cálculos, que agora nos parecem
arbitrários ou sem interesse, pertenciam, então, ao simbolismo filosófico do Oriente e tinham a
maior importância no ensino das coisas sagradas emanadas das ciências ocultas. O alfabeto
cabalístico absoluto, que unia as ideias primárias às alegorias, as alegorias às letras e as letras aos números, era o que se chamava, então, as chaves de Salomão. Já vimos que estas chaves,
conservadas até nossos dias, mas completamente desconhecidas, outra coisa não são que o jogo do
Tarô, cujas alegorias antigas foram notadas e apreciadas pela primeira vez, nos tempos atuais, pelo
sábio arqueólogo Court de Gebelin.
O duplo triângulo de Salomão é explicado por São João de um modo notável. Há, diz ele, três
testemunhos no céu: o Pai, o Logos e o Espírito Santo, e três testemunhos na terra: o enxofre, a água
e o sangue. São João está, assim, de acordo com os mestres da filosofia hermética, que dão ao seu
enxofre o nome de éter, ao seu mercúrio o nome de água filosófica, e ao seu sal a qualificação de
sangue do dragão ou mênstruo da terra: o sangue ou o sal corresponde por oposição ao Pai, a água
azótica ou mercúrio ao Verbo ou Logos, e o enxofre ao Espírito Santo. Mas as coisas de alto
simbolismo só podem ser bem entendidas pelos verdadeiros filhos da ciência.
As combinações triangulares uniam-se, nas cerimônias mágicas, às repetições dos nomes por três
vezes, e com entonações diferentes.
A baqueta mágica era, muitas vezes, remontada por uma forquilha imantada, que Paracelso
substituía por um tridente, cuja figura damos abaixo.
O tridente de Paracelso é um pantáculo que exprime o resumo do ternário na unidade, que completa,
assim, o quaternário sagrado. Ele atribuía a esta figura todas as virtudes que os cabalistas hebreus
atribuem ao nome de Jeová, e as propriedades taumatúrgicas do Abracadabra dos hierofantes de
Alexandria. Reconheçamos, aqui, que é um pantáculo e, por conseguinte, um signo concreto e
absoluto de uma doutrina inteira que foi a de um círculo magnético imenso, tanto para os filósofos
antigos como para os adeptos da Idade Média. Dando-lhes, moderadamente, o seu valor primitivo
pela inteligência dos seus mistérios, não poderíamos restituir-lhe toda a sua virtude milagrosa e todo
o seu poder contra as doenças humanas?
As antigas feiticeiras, quando passavam, à noite, por uma encruzilhada de três caminhos, uivavam
três vezes, em honra à tríplice Hécate.
Todas estas figuras, todos estes atos análogos às figuras, todas estas disposições de números e
caracteres nada mais são, como já dissemos, senão instrumentos de educação para a vontade, cujos
hábitos fixam e determinam. Servem também para reunir conjuntamente, na ação, todas as forças da alma humana, e para aumentar a força criadora da imaginação. È a ginástica do pensamento que se
exercita na realização: por isso, o efeito destas práticas é infalível como a natureza, quando são
feitas com uma confiança absoluta e uma perseverança inabalável.
Com a fé, dizia o grande Mestre, transportar-se-iam árvores ao mar e se deslocariam montanhas.
Uma prática, mesmo insensata, mesmo supersticiosa, é eficaz, porque é uma realização da vontade. É por isso que uma oração é mais poderosa, se formos fazê-la na igreja, do que se a fizéssemos em
nossa casa, e que ela alcançará milagres se, para fazê-la num santuário milagroso, isto é,
magnetizado em grande corrente pela afluência dos visitantes, fizermos cem ou duzentas léguas,
pedindo esmolas com os pés descalços.
Riem-se da mulher pobre que se priva de alguns centavos de leite, de manhã, e que vai levar os
triângulos mágicos das capelas uma pequena vela, que deixa acesa. São os ignorantes que riem, e a
mulher pobre não paga muito caro o que compra, assim, de resignação e coragem. Os abastados
mostram bastante altivez para passar levantando os ombros; eles se insurgem contra as superstições com um barulho que faz estremecer o mundo; e que resulta disso? As casas dos abastados se
desmoronam, e os restos delas são vendidos aos fornecedores e compradores de quinquilharias, que
deixam gritar de boa vontade, em toda parte, que o seu reino acabou para sempre, contanto que
governem sempre.
As grandes religiões só tiveram a temer uma rival séria, e esta rival é a magia.
A magia produziu as associações ocultas, que trouxeram a revolução chamada Renascença; mas
aconteceu ao espírito humano, cego pelos loucos amores, realizar em todos os pontos a história alegórica do Hércules hebreu: desmoronando as colunas do tempo, sepultou-se a si mesmo debaixo
das ruínas.
As sociedades maçônicas não conhecem, agora, a alta razão dos seus símbolos mais do que os
rabinos compreendem o Sepher Yetzirah e o Zohar na escala ascendente dos três graus, com a
progressão transversal da direita para a esquerda e da esquerda para a direita do setenário
cabalístico.

O compasso do G.´.A.´. e o esquadro de Salomão vieram a ser o nível grosseiro e material do
jacobismo ininteligente, representado por um triângulo de aço: eis para o céu e para a terra.
Os adeptos profanadores, aos quais o iluminado Cazotte tinha predito uma sangrenta morte,
ultrapassaram, atualmente, o pecado de Adão: depois de ter colhido temerariamente os frutos da
árvore da ciência, de que não souberam alimentar-se, lançaram-nos aos animais e répteis da terra. Por isso, o reino da superstição começou e deve durar até o tempo em que a verdadeira religião se
reconstituir nas bases eternas da hierarquia de três graus e do tríplice poder que o ternário exerce
fatal ou providencialmente nos três mundos.

III.  A IMPERATRIZ   por Crowley
Esta carta é atribuída à letra Daleth, que significa porta e se refere ao planeta Vênus. A carta é, a julgar pela aparência, o complemento de O Imperador, mas suas atribuições são muito mais universais. 

Na Árvore da Vida, Daleth é o caminho que conduz de Chokmah a Binah, unindo o Pai à Mãe. Daleth é um dos três caminhos que estão completamente acima do Abismo. Há, ademais, o símbolo alquímico de Vênus, o único dos símbolos planetários que abrange todas as Sephiroth da Árvore da Vida. A doutrina implícita é que a fórmula fundamental do universo é o Amor ( o círculo toca as Sephiroth 1, 2, 4, 6, 5, 3; a cruz é formada por 6, 9, 10  e  7, 8).  
É impossível resumir os significados do símbolo da mulher por esta razão mesma, a saber, ela continuamente reaparece sob forma infinitamente variada. “A de muitos tronos, muitas disposições, muitas manhas, filha de Zeus.” 
Nesta carta, ela é mostrada em sua manifestação mais geral. Combina as qualidades espirituais mais elevadas com as materiais mais baixas. Por esta razão, ela está apta a representar uma das três formas alquímicas da energia, o Sal. O Sal é o princípio inativo da natureza, é matéria que precisa ser energizada pelo Enxofre para preservar o equilíbrio rotativo do universo. Os braços e o tronco da figura, por conseguinte, sugerem a forma do símbolo alquímico do Sal. Ela representa uma mulher com coroa e trajes imperiais sentada a um trono, cujas colunas de apoio sugerem chamas azuis torcidas, simbolizadoras de seu nascimento da água, o feminino, elemento fluido. Em sua mão direita ela segura o lótus de Ísis, o lótus representando o feminino ou  poder passivo; suas raízes estão na terra sob a água, ou na própria água, mas ele abre suas pétalas para o Sol cuja imagem é o bojo do cálice. É, portanto, uma forma viva do Cálice Sagrado (O Santo Graal) santificada pelo sangue do Sol. Empoleirados nas colunas de apoio em forma de chama de seu trono estão duas de suas aves mais sagradas, o pardal e a pomba. O ponto essencial deste simbolismo precisa ser buscado nos poemas de Catulo e Marcial. Há abelhas sobre seu manto e também dominós, circundados por linhas espirais contínuas. A significação é similar em  toda  parte.  
Em torno dela, como um cinto, se acha o zodíaco.  
Sob o trono há um piso coberto de tapeçaria bordada com flores-de-lis e peixes, os quais parecem estar adorando a rosa secreta, que é mostrada à base do trono. A significação destes símbolos já foi explicada. Nesta carta todos os símbolos são cognatos devido à simplicidade e pureza do emblema. Não há aqui nenhuma contradição; a oposição que parece existir é apenas a oposição necessária ao equilíbrio, o que é indicado pelas luas giratórias.  
A heráldica da Imperatriz é dupla: de um lado o pelicano da tradição alimentando seus filhotes do sangue de seu próprio coração, do outro, a águia branca do alquimista. 
Com referência ao pelicano, seu simbolismo total só estava disponível para iniciados do quinto grau da  O. T. O.. Em termos gerais, pode-se sugerir o significado identificando-se o próprio pelicano fêmea com a Grande Mãe e sua  prole, com a Filha na fórmula do Tetragrammaton. É porque a filha  é  a filha de sua mãe que ela pode ser guindada ao seu trono. Em outras palavras, há uma continuidade da vida, uma herança de sangue, que junta todas as formas da  natureza. Não há ruptura entre luz e trevas. Natura non facit saltum.* Se estas considerações fossem inteiramente entendidas, possibilitaria a reconciliação da  teoria quântica com as equações eletromagnéticas.  
* Em latim no original, A natureza não dá saltos (NT).  
A águia branca neste trunfo corresponde à águia vermelha da carta-consorte, O Imperador. Aqui é preciso trabalhar em sentido inverso, pois nestas cartas mais elevadas se acham os símbolos da perfeição; tanto a perfeição inicial da natureza quanto a perfeição final da arte; não apenas Ísis, mas também  Néftis. Consequentemente, as minúcias do trabalho pertencem a cartas subseqüentes, especialmente Atu VI  e Atu XIV.  
Ao fundo da carta está o arco ou porta, que é a interpretação da letra  Daleth. Esta carta, em síntese, pode ser denominada  Porta do Céu. Contudo, devido à  beleza do símbolo, devido à sua apresentação omniforme, o estudante que está deslumbrado por qualquer dada manifestação pode extraviar-se. Em  nenhuma outra carta é tão necessário desconsiderar as partes para se concentrar no todo.


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