quinta-feira, 12 de maio de 2016

A SACERDOTISA ASPECTOS DO DOGMA E RITUAL ELIPHAS LEVI E CROWLEY




SACERDOTISA ABORDADA COMO DOGMA - Eliphas Levi
As Colunas do Templo
CHOCMAH – DOMUS - GNOSIS
A ciência é a posse absoluta e completa da verdade.
Por isso, os sábios de todos os séculos tremeram diante desta palavra absoluta e terrível; tremeram
arrogar-se o primeiro privilégio da divindade, atribuindo a si a ciência, e se contentaram, em lugar do verbo saber, que exprime o conhecimento, e da palavra ciência, com a de gnosis, que exprime somente a ideia do conhecimento por intuição.
Que sabe, com efeito, o homem? Nada, e, entretanto, nada lhe é permitido ignorar.
Nada sabe, e é chamado a tudo conhecer.
Ora, o conhecimento supõe o binário. É preciso para o ente que conhece um objeto conhecido.
O binário é gerador da sociedade e da lei; é também o número da gnose. O binário é a unidade
multiplicando-se por si mesma para criar; e é por isso que os símbolos sagrados fazem sair Eva do
próprio peito de Adão.
Adão é o tetragrama humano, que se resume no iod misterioso, imagem do phallus cabalístico.
Ajuntai a este iod o nome ternário de Eva, e formareis o nome de Jeová, o tetragrama divino, que é
a palavra cabalística e mágica por excelência:
hwh y
que o sumo sacerdote, no templo pronunciava Jodcheva. É assim que a unidade, completa na
fecundidade do ternário, forma com ele o quaternário, que é a chave de todos os números, de todos
os movimentos e de todas as formas.
O quadrado, girando sobre si, produz o círculo que lhe é igual e está para a quadratura do círculo como o movimento circular de quatro ângulos iguais que giram ao redor de um mesmo ponto.
O que está em cima, diz Hermes, é igual ao que está em baixo: eis o binário servindo de medida à
unidade, e a relação de igualdade entre o alto e o baixo, eis que forma com eles o ternário.
O princípio criador é o phallus ideal; e o princípio criado é o cteis formal.
A inserção do phallus vertical no cteis horizontal forma o stauros dos gnósticos ou a cruz filosófica dos maçons. Assim, o cruzamento de dois produz quatro, que, movendo-se, determinam o círculo com todos os seus graus.
a é o homem; b é a mulher; 1 é o princípio; 2 é o verbo; A é o ativo; B é o passivo; a unidade é
Bohas; o binário é Jakin.
Nos trigramas de Fo-Hi, a unidade é o Yang; e o binário é o Yin.
Yang Yin Bohas e Jakin são os nomes das duas colunas simbólicas que estavam diante da porta principal do templo de cabalístico de Salomão.
Estas duas colunas explicam em Cabala todos os mistérios do antagonismo, quer natural, quer
político, quer religioso, explicam a luta geradora do homem e da mulher, porque, conforme a lei a
lei da natureza, a mulher deve resistir ao homem, e este deve atraí-la ou submete-la.
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O princípio ativo busca o princípio passivo, o cheio é amante do vácuo. A goela da serpente atrai a sua cauda, e, girando sobre si mesma ela foge de si e persegue a si mesma.
A mulher é a criação do homem, e a criação universal é a mulher do primeiro princípio.
Quando o ente princípio se fez criador, erigiu um iod ou um phallus,e, para lhe dar lugar no cheio
da luz incriada, teve de cavar um cteis ou um fosso de profundidade igual à dimensão determinada
pelo seu desejo criador, e destinado por ele ao iod na luz irradiante.
Tal é a linguagem misteriosa dos cabalistas no Talmude, e, por causa da ignorância e da maldade do
vulgo, é-nos impossível explica-la ou simplifica-la mais.
Que é, pois, a criação? A casa do Verbo criador. Que é o cteis? É a casa do phallus.
Qual a natureza do princípio ativo? É espalhar. Qual é a natureza do princípio passivo? É reunir e
fecundar.
Que é o homem? É o iniciador, o que destrói, cultiva e semeia. Que é a mulher? É a formadora, a
que reúne, rega e ceifa.
O homem faz a guerra, e a mulher procura a paz; o homem destrói para criar, a mulher edifica para
conservar; o homem é a revolução, a mulher é a conciliação; homem é o pai de Caim, a mulher é a
mãe de Abel.
Que é a sabedoria? É a conciliação e a união dos dois princípios, é a docilidade de Abel dirigindo a energia de Caim, é o homem segundo as doces inspirações da mulher, é a depravação vencida pelo
legítimo casamento, é a energia revolucionária abrandada e dominada pelas doçuras da ordem e da
paz, é o orgulho submetido ao amor, é a ciência reconhecendo as inspirações da fé.
Então, a ciência humana torna-se sábia, porque ela é modesta, e se submete à infalibilidade da razão universal, ensinada pelo amor ou pela caridade universal. Ela pode tomar o nome de Gnose, porque, ao menos, conhece o que ainda não se pode vangloriar de saber perfeitamente.
A unidade só pode manifestar-se pelo binário; a própria unidade e a idéia da unidade já fazem dois.
A unidade do macrocosmo revela-se pelas duas pontas opostas dos dois triângulos.
A unidade humana completa-se pela direita e pela esquerda. O homem primitivo é andrógino. Todos
os órgãos do corpo humano são dispostos por dois, exceto o nariz, a língua, o umbigo e o iod
cabalístico.
A divindade, una na sua essência, tem duas condições essenciais por bases fundamentais do ser: a
necessidade e a liberdade.
As leis da razão suprema são necessárias em Deus e regulam a liberdade, que é necessariamente
razoável e sábia.
Para fazer visível a luz, Deus somente supôs a sombra.
Para manifestar a verdade, fez possível a dúvida.
A sombra é a repulsão da luz, e a possibilidade do erro é necessária para a manifestação temporal da verdade.
Se o escudo de Satã não parasse a lança de Mikael, a força do anjo vai se perderia no vácuo ou
deveria manifestar-se por uma destruição infinita dirigida de cima para baixo.
E se o pé de Mikael não retivesse Satã na sua ascensão, Satã iria destronar Deus, ou antes se perder nos abismos da altura.
Satã é, pois, necessário a Mikael como o pedestal à estátua, e Mikael é necessário a Satã como o
freio à locomotiva.
Na dinâmica analógica e universal, só há apoio no que resiste.
Por isso o universo é balanceado por duas forças que o mantêm em equilíbrio: a força que atrai e a
que repele. Estas duas forças existem em física, filosofia e religião. Elas produzem, em física, o
equilíbrio, em filosofia, a crítica; e em religião, a revelação progressiva. Os antidos representaram este mistério pela luta de Eros e Anteros, pelo combate de Jacó com o anjo, pelo equilíbrio da montanha de ouro, que conservam ligadas com a serpente simbólica da Índia, de um lado os deuses e do outro os demônios.
É também figurado pelo caduceu de Hermanubis, pelo dois querubins da arca, pelas duas esfinges
do carro de Osíris, pelos dois serafins, o branco e o preto.
A sua realidade científica é demonstrada pelos fenômenos da polaridade e pela lei universal das
simpatias ou antipatias.
Os discípulos ininteligentes de Zoroastro divinizaram o binário, sem referi-lo à unidade, separando, assim, as colunas do templo e querendo dividir Deus. O binário em Deus só existe pelo ternário. Se concebeis o absoluto como dois, é preciso imediatamente concebe-lo como três, para achar o princípio unitário.
É por isso que os elementos materiais análogos aos elementos divinos se concebem como quatro, explicam-se como dois e, finalmente, só existem como três.
A revelação é o binário; todo verbo é duplo ou supõe dois.
A moral que resulta da revelação é fundada sobre o antagonismo, que é a conseqüência do binário. O espírito e a forma se atraem e se repelem como a idéia e o sinal, como a verdade e a ficção. A
razão suprema necessita do dogma para se comunicar às inteligências finitas, e o dogma, passando
do domínio das idéias ao das formas, se faz participar dos dois mundos, e tem, necessariamente dois
sentidos que falam sucessivamente ou ao mesmo tempo, quer ao espírito, quer à carne.
Por isso, no domínio moral há duas forças: uma que tenta e outra que reprime e que expia. Estas
duas forças são figuradas nos mitos do Gênese pelos personagens típicos de Caim e Abel.
Abel oprime Caim por sua superioridade moral; Caim para libertar-se, imortaliza seu irmão matando-o, e fica vítima do seu próprio crime. Caim não pôde deixar viver Abel e o sangue de Abel
não deixa mais Caim dormir.
No Evangelho, o tipo de Caim é substituído pelo do Filho pródigo, a quem seu pai perdoa tudo, porque ele volta depois de ter sofrido muito.
Em Deus, há misericórdia e justiça; ele faz justiça aos justos e misericórdia aos pecadores.
Na alma do mundo, que é o agente universal, há uma corrente de amor e uma corrente de cólera.
Este fluido ambiente e que penetra em todas as coisas; este raio destacado da coroa do sol e fixado
pelo peso da atmosfera e pela força de atração central; este corpo do Espírito Santo que chamamos o
agente universal, e que os antigos representavam sob a figura da serpente que morde a sua cada; este éter elétrico e magnético, este calórico vital e luminoso, é figurado nos antigos monumentos pela
cintura de Isis, que se volve e resolve em laço de amor ao redor dos dois pólos, e pela serpente que morde a sua cauda, emblema da prudência e de Saturno.
O movimento e a vida consistem na tensão extrema das duas forças.
Prouve a Deus, dizia o Mestre, que fôsseis totalmente frio ou totalmente quente!
Com efeito, um grande culpado é mais vivo que um homem fraco e morno, e a sua volta à virtude
será em razão direta da energia dos seus desvios.
A mulher que deve esmagar a cabeça da serpente é a inteligência, que sempre vence a corrente das
forças cegas. É, dizem os cabalistas, a virgem do mar, cujos pés úmidos o dragão infernal vem lamber com sua língua de fogo, que se adormece de volúpia.
Tais são os mistérios hieráticos do binário. Mas existe um, o último de todos, que não deve ser
revelado: a razão disso está, conforme Hermes Trismegisto, na ininteligência do vulgo, que daria às
necessidades da ciência toda a capacidade imortal de uma cega fatalidade. É preciso conter o vulgo,
diz ele ainda, pelo temor do desconhecido; e o Cristo dizia também: “Não lanceis vossas pérolas aos
porcos, para que eles não as pisem, e voltando-se contra vós, não vos devorem”. A árvore da ciência
do bem e do mal, cujos frutos dão a morte, é a imagem deste segredo hierático do binário. Este
segredo, com efeito, se for divulgado, só pode ser mal compreendido, e concluir-se daí a negação
ímpia do livre arbítrio, que é o princípio moral da vida. Está, pois, na essência das coisas que a
revelação deste segredo dá a morte, e, entretanto, este não é ainda o grande arcano da magia: mas o segredo do binário conduz ao do quaternário, ou antes procede dele e se resolve pelo ternário, que
contém a palavra do enigma da esfinge tal como tinha de ser resolvido para salvar a vida, expiar o
crime involuntário e assegurar o reino de Édipo.
No livro hieroglífico de Hermes, que é também denominado o livro de Thot, o binário é
representado quer por uma grande sacerdotisa tendo os chifres de Ísis, a cabeça coberta, um livro
aberto, que oculta pela metade com seu manto;ou pela mulher soberana, a deusa Juno dos Gregos, tendo uma das mãos elevada para o céu e a outra abaixada para a terra, como se formulasse, por este
gesto, o dogma único e dualista que é a base da magia e que inicia os maravilhosos símbolos da
Tábua de Esmeralda de Hermes.

No Apocalipse de São João, trata-se de dois testemunhos ou mártires, aos quais a tradição profética
dá o nome de Elias e Enoque: Elias, o homem da fé, do zelo e do milagre; Enoque, o mesmo que os
Egípcios chamaram Hermes, e que os Fenícios honravam como Cadmo, o autor do alfabeto sagrado
e da chave universal das iniciações ao Verbo, o pai da Cabala, aquele, dizem as santas alegorias, que não morreu como os outros homens, mas que foi arrebatado ao céu para voltar no fim dos tempos.
Diziam, mais ou menos, a mesma coisa do próprio São João, que achou e explicou, no seu
Apocalipse, os símbolos do verbo de Enoque. Esta ressurreição de São João e Enoque, esperada nos
fins dos séculos de ignorância, será o renovamento das suas doutrinas pela inteligência das chaves
cabalísticas que abrem o templo da unidade e da filosofia universal, por muito tempo oculta e
reservada somente a eleitos que o mundo fazia morrer.
Mas dissemos que a reprodução da unidade pelo binário conduz forçosamente à noção e ao dogma
do ternário, e chegamos, enfim, a este grande número, que é a plenitude e o verbo perfeito da
unidade.



SACERDOTISA ABORDADA COMO RITUAL - Eliphas Levi
CAPÍTULO II
O EQUILÍBRIO MÁGICO
O equilíbrio é a resultante de duas forças.
Se as duas forças são absolutamente e sempre iguais, o equilíbrio será a imobilidade, e, por
conseguinte, a negação da vida. O movimento é o resultado de uma preponderância alternada.
O impulso dado a um dos pratos de uma balança determina necessariamente o movimento do outro.
Os contrários agem, assim, sobre os contrários, em toda a natureza, por correspondência e por
conexão analógica.
A vida inteira compõe-se de uma aspiração e de um sopro; a criação é a suposição de uma sombra
para servir de limite à luz, de um vácuo para servir de espaço à plenitude do ente, de um princípio
passivo fecundado para apoiar e realizar a força do princípio ativo gerador.
Toda a natureza é bissexual, e o movimento que produz as aparências da morte e da vida é uma
contínua geração.
Deus ama o vácuo que fez para encher; a ciência ama a ignorância que alumia; a força ama a
fraqueza que sustenta; o bem ama o mal aparente que o glorifica; o dia é apaixonado pela noite e a
persegue sem cessar, girando ao redor do mundo; o amor é, ao mesmo tempo, uma sede e uma
plenitude que tem necessidade de expansão. Aquele que dá recebe, e aquele que recebe dá; o
movimento é uma troca perpétua.
Conhecer a lei desta troca, saber a proporção alternativa ou simultânea destas forças é possuir os
primeiros princípios do grande arcano mágico, que constitui a verdadeira divindade humana.
Cientificamente, podemos apreciar as diversas manifestações do movimento universal pelos
fenômenos elétricos ou magnéticos. Os aparelhos elétricos revelam principalmente, material e
positivamente, as afinidades e antipatias de certas substâncias. A união do cobre com o zinco, a
ação de todos os metais na pilha galvânica, são revelações perpétuas e irrecusáveis. Que os físicos
procurem e descubram; os cabalistas explicarão as descobertas da ciência.
O corpo humano está submetido, como a terra, a uma dupla lei: atrai e irradia; está imantado com
um magnetismo andrógino e reage sobre as duas potências da alma, a intelectual e a sensitiva, em
razão inversa, mas proporcional, das preponderâncias alternadas dos dois sexos no seu organismo
físico.
A arte do magnetizador está inteiramente no conhecimento e no emprego desta lei. Polarizar a ação
e dar ao agente uma força bissexual e alternada é o meio ainda desconhecido e vãmente procurado
de dirigir à vontade os fenômenos do magnetismo; mas é preciso um tato muito exercitado e uma
grande exatidão nos movimentos interiores para não confundir os sinais de aspiração magnética com os da expiração; é preciso também conhecer perfeitamente a anatomia oculta e o temperamento especial das pessoas sobre as quais se age.
O que traz maior obstáculo à direção do magnetismo é a má fé ou má vontade dos pacientes. As
mulheres, principalmente, que são essencialmente e sempre comediantes, as mulheres que gostam
de se impressionar, impressionado os outros e que são as primeiras que se enganam, quando
representam o seu melodrama nervoso, as mulheres são a verdadeira magia negra do magnetismo.
Por isso, será impossível a magnetizadores não iniciados nos supremos arcanos e não assistidos com
as luzes da Cabala, dominar este elemento refratário e fugidio. Para ser senhor da mulher é preciso
distraí-la e enganá-la habilmente, deixando-lhe supor que é ela que vos engana. Este conselho, que
aqui damos especialmente aos médicos magnetizadores, talvez pudesse ter também sua utilidade e
sua aplicação na política conjugal.
O homem pode produzir à vontade dois sopros, um quente e outro frio; pode, igualmente, projetar à
vontade a luz ativa ou a luz passiva; mas é preciso que adquira a consciência desta força pelo hábito de pensar nela. Um mesmo gesto da mão pode, alternativamente, expirar e aspirar o que, por conveniência, chamamos fluido; e o próprio magnetizador será advertido do resultado da sua
intenção por uma sensação alternativa de calor e frio na mão, ou nas duas mãos, se operar com as
duas mãos ao mesmo tempo, sensação que o paciente deverá sentir ao mesmo tempo, mas em
sentido contrário, isto é, com uma alternativa totalmente oposta.
O pentagrama, ou signo do microcosmo, representa, entre outros mistérios mágicos, a dupla simpatia das extremidades humanas entre si e a circulação da luz astral no corpo humano. Assim,
figurando um homem na estrela do pentagrama, como podemos ver na filosofia oculta de Agrippa,
deve-se notar que a cabeça corresponde, em simpatia masculina, com o pé direito e em simpatia
feminina com o pé esquerdo; que a mão direita corresponde, do mesmo modo, com a mão e o pé esquerdos, e a mão esquerda, reciprocamente: o que é preciso observar nos passes magnéticos, se
quisermos chegar a dominar o organismo inteiro e a prender todos os membros pelas suas próprias
cadeias de analogia e de simpatia natural.
Este conhecimento é necessário para o uso do pentagrama, nas conjurações dos espíritos e
evocações das formas errantes na luz astral, chamadas vulgarmente necromancia, como
explicaremos no quinto capítulo deste Ritual; mas é bom observar, aqui, que toda ação provoca uma
reação, e que, magnetizando ou influenciando magicamente os outros, estabelecemos deles para nós
uma corrente de influência contrária, mas análoga, que pode submeter-nos a eles em vez de os
submeter a nós, como muitas vezes acontece nas operações que têm por objeto a simpatia e o amor.
É por isso que é essencial defendermo-nos, ao mesmo tempo em que atacamos, a fim de não
aspirarmos com a esquerda, ao mesmo tempo em que sopramos com a direita.
O andrógino mágico traz escrito, no braço direito: solve, e, no braço esquerdo: coagula, o que
corresponde à figura simbólica dos trabalhadores do segundo templo, que numa das mãos tinham a
espada e na outra a régua. Ao mesmo tempo em que se constrói é preciso defender a sua obra,
dispersando os inimigos: a natureza nada mais faz, quando destrói ao mesmo tempo em que
regenera. Ora, conforme a alegoria do calendário mágico de Duchenteau, o homem, isto é, o
iniciado, é o macaco da natureza, que o conserva preso, mas também o faz agir incessantemente em
imitações dos processos e das obras da sua divina senhora e do seu imperecível modelo.
O emprego alternado das forças contrárias, o quente depois do frio, a afabilidade depois da
severidade, o amor depois da cólera, etc., é o segredo do movimento perpétuo e do prolongamento
do poder; é o que instintivamente sentem as namoradeiras, que fazem passar seus adoradores da
esperança ao temor e da alegria à tristeza. Agir sempre no mesmo sentido e do mesmo modo é
sobrecarregar um único prato da balança, e disso logo resultará a destruição absoluta do equilíbrio.
A perpetuidade das carícias engendra logo a saciedade, o desgosto e a antipatia, do mesmo modo
que uma frialdade e uma severidade constante afasta e desanima aos poucos a afeição. Em alquimia,
um fogo é sempre o mesmo e continuamente ardente, calcina a matéria-prima e faz, às vezes,
rebentar o vaso hermético: é preciso substituir, em intervalos regulados, pelo calor do fogo ou da cal
ou do adubo mineral. É assim que é preciso, em magia, temperar as obras de cólera ou de rigor por
operações de benevolência e de amor, e que, se o operador conservar a tensão da sua vontade
sempre no mesmo sentido e da mesma forma, resultará disso uma grande fadiga para ele e logo uma
espécie de impotência moral.
O mago não deve, pois, viver exclusivamente no seu laboratório, entre seu Athanor, seus elixires e
seus pantáculos. Por mais devorador que seja o olhar desta Circe, que chamamos a força oculta, é
preciso saber apresentar-lhes a propósito a espada de Ulisses e afastar a tempo, dos nossos lábios, o
copo que ela nos apresenta. Sempre uma operação mágica deve ser seguida de um repouso igual à
sua duração e de uma distração análoga, mas contrária ao seu objeto. Lutar continuamente contra a
natureza para dominá-la e vencê-la é expor a sua razão e a sua vida. Paracelso ousou fazê-lo, e, não
obstante, até nesta luta, empregava forças equilibradas e substituída a embriaguez pela fadiga
corporal, e a fadiga corporal por um novo trabalho da inteligência. Por isso, Paracelso era um
homem de inspiração e de milagres; mas gastou a sua vida nesta atividade devoradora, ou antes,
fatigou e rasgou rapidamente a sua vestimenta porque os homens semelhantes a Paracelso podem
usar e abusar, sem nada temer; sabem muito bem que não poderiam morrer, assim como não devem
envelhecer neste mundo.
Nada predispõe mais à alegria do que a dor e nada está mais perto da dor do que a alegria. Por isso,
o operador ignorante fica admirado de chegar sempre a resultados contrários aos que se propõe,
porque não sabe nem cruzar nem alternar sua ação; quer enfeitiçar seu inimigo, e torna a si próprio
infeliz e doente; quer fazer-se amar, e apaixona-se miseravelmente por mulheres que zombam dele;
quer fazer ouro, e gasta seus últimos haveres: o seu suplício é eternamente o de Tântalo, a água se
retira sempre, quando quer beber.
Os antigos, nos seus símbolos e nas suas operações mágicas multiplicavam os signos do binário,
para não esquecerem a sua lei, que é a do equilíbrio. Nas suas evocações, sempre construíram dois
altares diferentes e imolavam duas vítimas, uma branca e outra negra; o operador ou a operadora,
tendo numa das mãos a espada e na outra a baqueta, devia ter um pé calçado e outro descalço.
Todavia, como o binário seria a imobilidade e a morte sem o motor equilibrante, só podiam ser um
ou três, nas obras de magia; e quando um homem e uma mulher tomavam parte na cerimônia, o
operador devia ser uma virgem, um andrógino ou uma criança.
Perguntar-me-ão se a bizarria destes ritos é arbitrária e se ela tem por fim exercitar a vontade,
multiplicando a seu bel-prazer as dificuldades da obra mágica. Responderei que, em magia, nada há
de arbitrário, porque tudo é regulado e determinado adiantadamente pelo dogma único e universal
de Hermes, o da analogia nos três mundos. Todo signo corresponde a uma idéia e tem a forma
especial de uma idéia; todo ato exprime uma vontade correspondente a um pensamento e formula as
analogias desse pensamento e dessa vontade. Os ritos são determinados adiantadamente pela própria
ciência. O ignorante, que não sabe o seu tríplice poder, sofre a sua fascinação misteriosa; o sábio os
entende e faz deles o instrumento da sua vontade; mas, quando são realizados com exatidão e fé,
nunca fiam sem efeito.
Todos os instrumentos mágicos devem ser duplos; é preciso ter duas espadas, duas baquetas, dois
copos, dois fogareiros, dois pantáculos e duas lâmpadas; trazer duas vestimentas superpostas e de
cores contrárias, como ainda o praticam os padres católicos; é preciso não ter consigo nenhum metal
ou ter dois. As coroas de loureiro, arruda, artemísia ou verbena devem ser igualmente duplas; nas evocações, guarda-se uma das coroas e queima-se a outra, observando como augúrio o ruído que faz
ao queimar e as ondulações da fumaça que produz.
Esta observância não é vã, porque, na obra mágica, todos os instrumentos da arte são magnetizados
pelo operador; o ar está carregado dos seus perfumes, o fogo consagrado por ele está submetido à
sua vontade, as forças da natureza parecem ouvi-lo e responder-lhe; lê em todas as formas as
modificações e os complementos do seu pensamento. É então que vê a água turvar-se e como que ferver por si mesma, o fogo dar grande luz ou se extinguir, as folhas das grinaldas agitarem-se, a
baqueta mágica mover-se por si mesma, e que ouve passar, no ar, vozes estranhas e desconhecidas.
Foi em semelhantes evocações que Juliano viu aparecerem os fantasmas muito amados dos seus
deuses decaídos e, contra sua vontade, espantou-se da decrepitude e palidez deles.
Sei que o cristianismo suprimiu para sempre a magia cerimonial e proscreve severamente as
evocações e os sacrifícios do mundo antigo: por isso, a nossa intenção não é dar-lhes uma nova
razão de ser, vindo revelar, depois de tantos séculos, os seus antigos mistérios. As nossas
experiências, até nesta ordem de fatos, foram investigações sábias e nada mais. Constatamos fatos
para apreciar causas, e nunca tivemos a pretensão de renovar ritos para sempre destruídos.
A ortodoxia israelita, esta religião tão racional, tão divina e tão pouco conhecida, não reprova
menos que o cristianismo os mistérios da magia cerimonial. Até para a tribo de Levi, o exercício da
alta magia, devia ser considerado como uma usurpação do sacerdócio, e é a mesma razão que fará
proscrever, por todos os meios oficiais, a magia operadora, adivinhatória e milagrosa.
Mostrar o natural do maravilhoso e produzi-lo à vontade é destruir para o vulgo a prova conclusiva
dos milagres que cada religião reivindica como sua propriedade exclusiva e seu argumento
definitivo.
Respeito às religiões estabelecidas, mas há também lugar para a ciência. Não estamos mais, graças a Deus, no tempo dos inquisidores e das fogueiras; não se assassinam mais infelizes sábios, pela
crença de alguns fanáticos alienados ou de algumas moças histéricas. Aliás, seja entendido que
fizemos estudos curiosos, e não uma propaganda impossível, insensata. Os que nos criticarem de
ousarmos chamar-nos magos, nada têm a temer de um tal exemplo, e é mais que provável que nunca
se tornarão feiticeiros.

 por Crowley

II.  A ALTA SACERDOTISA 
Esta carta se refere à letra Gimel, que significa camelo (o simbolismo do camelo é elucidado na seqüência).  
A referência da carta é à Lua. A Lua (sendo o símbolo feminino geral, o símbolo da segunda ordem correspondendo ao Sol como o yoni corresponde ao lingam) é universal e vai do mais alto ao mais baixo. Trata-se de um símbolo que reaparecerá  frequentemente nestes hieróglifos. Mas nos primeiros trunfos a concorrência é com a natureza abaixo do Abismo; A Alta Sacerdotisa é a primeira carta que liga a Tríade Superior com a Héxade, e seu caminho, como é mostrado no diagrama, produz uma conexão direta entre o Pai em seu aspecto mais elevado e o Filho em sua manifestação mais perfeita. Este caminho está em equilíbrio exato no Pilar do Meio. Há aqui, portanto, a mais pura e mais exaltada concepção da Lua (no outro extremo da escala está o Atu XVIII, q. v.).  
A carta representa a forma mais espiritual de Ísis, a virgem eterna, a Ártemis dos gregos. Ela está trajada tão-somente do véu brilhante de luz. É importante para a alta iniciação considerar a Luz não como a perfeita manifestação do Espírito Eterno, mas, preferivelmente, como o véu que oculta este Espírito. Ela assim o faz sumamente efetiva devido ao seu brilho incomparavelmente deslumbrante. *  Assim ela é luz e o corpo de luz. Ela é a verdade atrás do véu de luz. Ela é a alma de luz. Sobre os joelhos dela está o arco de Ártemis, que é também um instrumento musical pois ela é caçadora e caça por encantamento. 
Agora que se considere esta ideia como a partir de detrás do Véu de Luz, o terceiro Véu do nada original. Esta luz é o mênstruo da manifestação, a deusa Nuit, a possibilidade da Forma. Esta manifestação primeira e maximamente espiritual do feminino toma para si um correlativo masculino ao formular em si mesma qualquer ponto geométrico a partir do qual se contempla a possibilidade. Esta deusa virginal é então potencialmente a deusa da fertilidade. Ela é a idéia por trás de toda a forma; logo que a influência da tríade desce abaixo do Abismo ocorre a conclusão da idéia concreta.  
* A tradição das melhores escolas do misticismo hindu possui um paralelismo preciso. O obstáculo final à Iluminação plena é exatamente esta Visão de Efulgência Amorfa.  
Os capítulos seguintes, de The Book of  Lies (falsely so-called), ** pode auxiliar o estudante a compreender essa doutrina por meio de meditação:  
** O Livro das Mentiras (falsamente assim chamado) (NT).    
DIABOS DE PÓ  
No Vento da mente, nasce a turbulência chamada Eu. Ele rompe; inunda os pensamentos estéreis. Toda vida é sufocada. Este deserto é o Abismo onde está o Universo. As Estrelas    são apenas cardos nesta aridez. Contudo, este deserto é apenas um lugar amaldiçoado num    mundo de glória. Agora e novamente, Viajantes cruzam o deserto; eles vêm do    Grande Mar, e para o Grande Mar eles vão. Enquanto caminham, eles derramam água; um dia eles irrigarão o    deserto, até que floresça.
Vê! cinco pegadas de um Camelo! V.V.V.V.V. 
No fundo da carta, há figuras nascentes, cristais, sementes, simbolizando o início da vida. No meio, está o Camelo que é mencionado no capítulo cotado acima. Nesta carta, está a ligação entre os mundos arquetípico e criativo. 
Considerou-se este caminho, até aqui, pelo fato de ele descer direto da Coroa; mas para o Aspirante, ou melhor, para o Adepto que já está em Tipharet, tendo alcançado o Conhecimento e Conversação do Sagrado Anjo Guardião, este é o caminho que leva para cima; e esta carta, em um sistema chamada de “A Princesa da Estrela Prateada”, simboliza o pensamento (melhor: a radiância inteligível) do Anjo. Em resumo, este é um símbolo da mais alta iniciação. Mas é uma condição da iniciação que suas chaves sejam comunicadas, por aqueles que as possuem, para todos os verdadeiros aspirantes. Esta carta é, portanto, um glifo muito peculiar do trabalho da A∴A∴ Uma idéia dessa fórmula é dada neste outro capítulo do Livro das Mentiras: 
A OSTRA 
Os Irmãos da Α∴Α∴são um com a Mãe da Criança. (4) Os Muitos são adoráveis ao Um, como o Um o é para os Muitos. Este é o     Amor Destes; criação-parto é a Glória do Um; coito-dissolução é a Glória     de Muitos. O Todo, assim combinado com Estes, é Glória. Nada está além da Glória.  O Homem delicia-se ao unir-se com a Mulher; a Mulher em parir uma     Criança. Os Irmãos da Α∴Α∴são Mulheres: os Aspirantes à Α∴Α∴são     Homens.  
É importante refletir que esta carta é inteiramente feminina, inteiramente virginal pois representa a influência e o meio de manifestação (ou, de baixo, de obtenção) em si mesma. Representa possibilidade em seu segundo estágio sem qualquer começo de consumação.  
Cumpre observar, em particular, que as três letras consecutivas, Gimel, Daleth e Hé (Atu II, III, XVII) exibem o símbolo feminino (Yin) sob três formas compondo a Deusa Triuna. Esta trindade é imediatamente seguida pelos três Pais correspondentes e complementares, Vau, Tzaddi, Yod (Atu IV, V, IX). Os trunfos 0 e I são hermafroditas. Os catorze trunfos restantes representam estas Quintessências Primordiais do Ser em conjunção, função ou manifestação. 


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